O degrau era maior que o passo e a memória menor que a lembrança daqueles primeiros anos de infância. Menor também era, a cada vez, o espaço para cruzar aquela escada da casa à rua, afinal, o tempo de casa era quase o mesmo que o de vida dos pequenos.
Tudo tinha gosto de fruto doce no ninho lá de cima; era um sonho da família, dessas formadas por dois casais, um de gente grande e um de gente pequena. Lá dentro tinha cachorro, tinha pintura, tinha quintal, terraço, grama e cada vez menos motivos para cruzar pro lado de baixo. A felicidade tangia ao infinito vezes mil milhões, como o número de histórias e sonhos.
O mundo dos pequenos era grande mas o dos grandes era cada vez menor. O homem grande agora ficava mais no lado da rua, abaixo do sonho e no limite da liberdade. A tabuada agora era de divisão dos milhões de felicidade.
Um dia, depois de muitos, o grande cruzou a escada e sentou bem no degrau do topo, ao lado da pequena e se falaram não por palavra mas por olho. Na altura dos olhos, tinham o mesmo tamanho; a água no olho do pai deixou a filha com coração molhado e boca seca. Num abraço menor que o braço, a filha acolheu o pai.
Cruzaram a escada com passos únicos, os dois do mesmo tamanho, multiplicando e dividindo por si mesmo. No lado de baixo, cada caminho seguiu para o seu próprio lado, sem nunca mais voltar para o sonho de cima.